quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

A nudez do rei

Quando precisamos assistir ao espetáculo a partir do galinheiro do teatro, nem sempre saímos do show extasiados de prazer. Assistiríamos à apresentação e concomitante às reações dos espectadores. Como nos alertaria Saramago, estamos sujeitos, nesse ponto estratégico, a ver "as falhas" da coroa do rei. Assim, se entre os espectadores houvesse um rei, veríamos, quem sabe, que o serviçal poliu a coroa somente na parte frontal; veríamos, talvez, que o rei resmunga da dor que a coroa o impinge; poderíamos, oportunamente, testemunhar que o rei não é tão majestoso assim ao cochilar durante parte do espetáculo; perceberíamos que no silêncio do rei, nem sempre está a atenção que supomos; notaríamos, por instantes, que no semblante do rei os trejeitos são vícios antigos; e, por fim, poríamo-nos a indagar o que aprendemos com essa visão. No teatro sem camarote, de olhos cerrados, os odores são lembranças vívidas e fazem chorar. No teatro sem camarote, a vida tem outro cheiro.


* Este texto é dedicado a todos os reis que moram em castelos de areia.